Avaliação de ativos precisa evoluir no Brasil

"A pesquisa de intangíveis no país ainda é relegada ao segundo plano. No exterior, por ter impactos fiscais, é um dos principais assuntos quando se começa a planejar uma aquisição", diz Fabio Pecequilo, diretor da auditoria Mazars. "No Brasil, o processo de análise de intangíveis fica para o fim do processo, para contentar o auditor."

Por Tatiane Bortolozi e Renato Rostás | De São Paulo | Jornal Valor Econômico 

O estudo sobre intangíveis no Brasil esbarra na falta de experiência das empresas e no pouco conhecimento de investidores e, por isso, ainda precisa ser aprofundado, dizem especialistas. A sanção da Medida Provisória 627, que acabou com o regime tributário de transição (RTT), divide especialistas sobre como poderá melhorar a apuração desses ativos, como marcas, patentes e modelos de negócios.

"A pesquisa de intangíveis no país ainda é relegada ao segundo plano. No exterior, por ter impactos fiscais, é um dos principais assuntos quando se começa a planejar uma aquisição", diz Fabio Pecequilo, diretor da auditoria Mazars. "No Brasil, o processo de análise de intangíveis fica para o fim do processo, para contentar o auditor."

Para Ana Cristina França, diretora-executiva da Anefac e sócia-diretora da Apsis Consultoria, a mensuração e divulgação de ativos intangíveis melhoraram no Brasil, mas seus impactos demoram a chegar ao investidor. Ainda faltam informação e interesse ao acionista, segundo ela.

Os ativos intangíveis trazem uma importante vantagem competitiva tanto a empresas quanto a países. Enquanto as companhias têm acesso relativamente fácil à aquisição de terrenos, edifícios, máquinas e ferramentas (ativos tangíveis), as marcas, as pessoas, as patentes e outros ativos considerados intangíveis são únicos.

Nos Estados Unidos, por exemplo, em julho o Produto Interno Bruto (PIB) será 3% maior como parte de uma mudança para integrar ativos como royalties de filmes e investimentos em pesquisa e desenvolvimento ao total de riquezas do país.

A discussão sobre intangíveis voltou ao foco com a aprovação da MP 627, em maio, que determinou que o novo padrão contábil, introduzido no fim de 2007 será adotado para quantificar o ágio em novas aquisições. A nova prática, entretanto, em comparação à atual, pode reduzir, e muito, o valor do ágio a ser apropriado e, com isso, as empresas perderiam parte dos créditos fiscais.

Ana Cristina acredita que a MP 627 vai ajudar a melhorar a apuração dos intangíveis. "Com o pronunciamento [do Comitê de Pronunciamentos Contábeis] CPC 15, de combinação de negócios, e a MP 627, passou a ser necessário calcular o valor justo de todos ativos e passivos. Só quando não é mais justificável e não há base sólida é que se pode interpretar como ágio [o chamado 'goodwill']", diz a especialista. "Um exemplo é a própria carteira de clientes, que deixaria de ser o 'goodwill' e apareceria no restante do intangível."

Já Tânia Relvas, professora da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), acha que o efeito da MP 627 é limitado na mensuração dos intangíveis. Segundo ela, o balanço continuará o mesmo. O que muda é a criação de subcontas, para evidenciar a mais-valia ou menos-valia (diferença entre o valor contábil de ativos e passivos e o valor justo) dos negócios, mas que são apresentados apenas para a empresa, e não são divulgados no balanço para investidores.

Pecequilo, da Mazars, acredita que, com o possível impacto fiscal, as companhias vão se ajustando gradativamente. "O próprio mercado vai demandar melhoras. O mercado vai se autorregular, como fez em diversas oportunidades."

A introdução das normas internacionais de contabilidade no Brasil colocou em pauta uma discussão que vem mudando a contabilidade no mundo.

"Na década de 1980, o valor de uma empresa era composto em cerca de 20% pelo intangível e em 80% por ativos tangíveis, como máquinas e equipamentos. Hoje, houve uma inversão: a participação dos intangíveis chega a 80% do valor das companhias", diz José Roberto Kassai, professor da Fipecafi.

"É tudo muito novo, mas estamos em uma curva de aprendizagem crescente", comenta Tânia, da Fipecafi. "Temos mais cerca de cinco anos pela frente para amadurecer a questão", afirma ela, referindo-se ao período para a capacitação de profissionais e a adaptação das empresas à nova realidade contábil.